la caisse du mouton
Antoine de Saint-Exupéry

thy way


O sono nunca acaba interrompe
Vinda de limiares excedidos
Ambicionava o fim
Do sono esqueci o pulso
Demorei confusa e o coração
Preso à razão entre traduções
De hipóteses sem verdade
Bafejou. E eu avanço
A descansar.


Que a consciência ordena
Além dos guinchos braços retorcidos
O prejuízo menor mora no travesseiro.

Labutamos a apalavrar o reforço
De verdades confortáveis
A acreditar n’elas incertas.


O sono ambicionava o fim
E o coração sem verdade
Apalavrou o reforço decifrou
Esquemas sobre esquemas sobre
Esquemas. Esqueletos e resumos.
O fim adormeceu no pulso. O bafo
Avançou uma hipótese
Sem tradução atrapalhou sono pulso
Interrupção fim verdade descanso.

E eu avanço.

spirit of baraka

[ silêncio ]

Cometi justiça encarregados os escrúpulos
bens dos haveres reverti dias e ontem.
Expeditamente provei actos sem omissões.

Agora sono enamorada.



[ limpa-te ]

Dentro do peito fazes crença
Mouca atenta ao sangue
Silencioso limpa-te
Entre as vagens
Escarafuncha o melhor sumo
Bebe deita-te em segredo

Perfura os arsenais brancos


És inútil

Das guerras não sabes
Mercar batalhas

Crês na palavra insistes

Vê a sarna a criar o peito
Emana na aflição esquecida
Pela paz escondida do leite

Maternal hás-de ser mortalha
Sôfrega a luta houve não faças
Crenças moucas mudas
Ao sangue silencioso limpa-te.






photo de Desiree Dolron

[ ar ]

Photobucket



Caso primaveras
ao Inverno

não sou ave
respiro.

.

[ (que a pele cerze vidas nas estações) ]

casco outonos em paz
descanso
colo árvores

em flor





still do filme Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera de Kim Gi-deok [Kim Ki-duk]

[ evidência ]

Jamais soube o que é estar de pé
em equilíbrio inventei estes modos
ver cores a estremecer os meus olhos
são a inquietação lágrimas como contas
dum colar partido à luz. Não aguento
um esgar, não aguento encarnações
de dor sou uma fraca que engendrou
a religião da outra face cedo ouvi a lenda

ficou impregnada nas minhas rosas.


Que hei-de fazer a este jeito que choro
até ao afinco do ardor nas órbitas só
consigo filtrar a beleza como absoluto.

Que hei-de fazer a este jeito que me traz
tal intervalo um néon. Eu escrevo.
Largo o tremor das mãos a cada palavra
continuo sem saber. Este jeito há-de ser
o meu fim. (este jeito a ser inícios de mim)

Como podereis constatar gaguejo.




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photo de c


dedicado...
a mim e aos colos insuflados
à
Marta, por escrever:

O coração não abrevia
antes desata os nervos,
a inspiração
no arremesso das palavras.

[ o meu avalo ]

Como se para sempre
Fora para sempre,
Por exemplo,
Vozes humanas calam-se

A barriga arde em pacto com dormência
Dorsal, há-de ser um nervo interdito
Pelas espinhas, o mundo presta
Tanto quanto eu, todavia contemplo bondade

Aprecio a dormência a deter-se
O coração não abrevia

Ressaco na intermitente pena
repete-se
na minha cabeça
a ressaca

de mundo



Abono direitos de desdizer

Calo provérbios do povo
Mais cega fora, não quis ver
E não merece castigo o que é
Abafo do mal menor
Não fostes vós, sou eu

Retraída a matar inícios inúteis
Sinto o sol na cara, sem paladar acre
Resguardada do desprezo e à mercê
Dos ditos ajuizados nada confirmo
Por isto, venho avalizar as árvores
Que quero rodear de mãos e assentar
Com os meus amores, com o meu amor.


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{ abraço }


Espera
estes não são os beijos todos.



Silencio
tenho para mim esses beijos.

Oh. Dos braços calo-me
a bambolear saudade.


photo de My Blueberry Nights - Wong Kar-Wai, descaradamente surripiada à menina-limão

cenas & vocação

Tenho faltado ao cinema
Aqui na terra não é como no céu

Há filmes hediondos de metragens
idênticas a Sentenças Sem fim


Tenho faltado tanto ao cinema
É este receio

Sei que estou a desenvolver
As artes de performance

Corajosa
É este receio

A meio da fita, saltar
Iluminada pelo projector
Interromper a matiné

Deixar a plateia incauta
boquiaberta
Com esta actriz que nasceu.



photo

[ entre extremos neutros ] *

O gato não pára de falar
não lhe ladrei para que se cale
diz de tudo, diz as conveniências necessárias
à purificação destes extremos neutros

sussurro a cinza
hipóteses
vê-se o meu bafo no gelo

o gato continua, não pára

finjo-me distraída a pintar as folhas
de embrulhos
oferendas decoradas com análises
de meta-vivência

desenho mais e mais
o gato não se cala, aproxima-se
chego uma cadeira vazia para mim

sobe a cadeira num pulo
deita-se à minha beira
o gato cala-se, ronrona

desenho corações, estrelas
flores, borboletas, velas
abelhas
desenho ramagens variadas
coloridas
aves
desenho dentro do espectro que vai
de um extremo neutro ao outro
extremo neutro
na minha fórmula caseira
descanso.




* expressão surripiada à menina-limão ali



imagem surripiada ali

{...}

.
Continuamos sem notícias tuas
Ontem ficámos quietos a ouvir
A noite que estrangulava a luz

Dentro do nevoeiro havia vida
Sebastiões anunciados uivavam

Agora agarramos a manhã sós

Amanhã escreveremos epitáfios no musgo.



Moss, 2001, c-print on dibont with foil, 125 x 100 cm, Jannie Regnerus
photo surripiada à
Coelha

[ mutações ]

.
A certa parte da batalha tropeço
Coberta de lama em nada poética
Chegam os passados de morgues
E cangalheiros em nada poéticos

Urge embriagar o coração penhorado
Segue o calor pelos tubos fisiológicos
Abaixo a corrente que fora laço
A insónia da lucidez persiste

Na razão a aflição prossegue perversa
Porém essa razão responde o sussurro
Que a batalha tem fim destinado

Se esta vida é uma guerra com fim
Nesta morte fecho os olhos
Vejo vinha virgem, não vejo glicínias.


título e photo surripiados ao c

{...}

Trago-te tão longe daqui

caminho a passos brandos
de mãos inquietas
sigo tarefeira a fingir
sigo
a interpretar alguém
que não existo


cogito,
a ser entidade, sou de tão longe
daqui

sou daí, onde as minhas mãos aquietam
de pele.

Puttelaar 10 [47 kB]
photo: Carla van de Puttelaar

[ lex II ]

Serei o meu último
recurso

serei o que tenho
nos olhos

é provável que engasgue
a esgravatar nas tripas
a magicar castigos e sede
(exercícios apenas)
(é provável).

Na prática,
o dia há-de acabar e eu suja
de feridas
limpa
regressarei
com os do meu regaço
e as mãos inchadas
d’O meu sangue
revolvida
resolvida.

Gritarei
Iustitiae na pele.


dawn no.1, 1959
Jan Saudek

My Big Fish

Desmaio?
Re: Não.
Ainda há heróis
amolecidos.

Estarei a estiolar?
Re: Não.
O meu corpo é coberto
amolecido de ti
uma flor.


Ajo?
Re: Broto coragem.

Traslado esta querença
num beijo
num poema
até completar a ode
ao teu amolecimento.

anjos para ti

Anjos para ti

são.

Sossego os poros, li
anjos para mim.

Leio, releio e não gasto as palavras de vida
vejo, olho


pecado mortal fome mesa cozinha hemisfério solitárias cantos gregorianos oratórias pastos aveia, pousio, tremocilha avental imaculado poças água corações apertados pequeninos ler muros escola joaquim embrulhado lençóis linho cresce casa cheiro pão mãos magras entrelaçadas dedos trepadeiras rosas vermelhas abóbada cerca valados musgo joaquina rosa olhar regaço mansos branco fogão oiro quintal casa adormecida flores papel arraial pautas galhos pétalas procissão cama frio solares escadas passadiço música madrugada hortênsias poda jasmim relógio azuladas linha horizonte madrigais porcelana pessegueiro tropeço silêncio brumas aragem geada passarada estrela d’alva vulto negro pinhal gemas maçãs areia chocolate negro negro


azul azul azul










e
o vinho quente com especiarias e gomos de laranja
sim!
de negro hoje também sou minhota
finjo que enfiei contas de oiro de viana
pendentes de oiro puro, arrecadas

e imagino as flores na casa quente
a honra de me sentir olhar um anjo com anjos

lugares reservados no coração.

Um beijo, Cláudia.


todas as palavras brotadas a partir das palavras da Blue #1 #2 #3

{...}

.


esta noite
gostaria de ser capaz


_______________de organizar
As Palavras


não consigo
ordinárias


as palavras.




.

[ fluxos no avesso das palavras ] *

Percebes. Estou a pisar uma dose dura de palavras que desembocam em mim
pelas partes baixas. Fico sem pingo de sangue nestas mãos que não agarram

quaisquer verbos

vibro de suculências
e as mãos frias
penduram direcção à entrada
das palavras
se me enteso a arrogar
intimidade com os verbos
já as mãos sem pingos
largam pareceres
ininteligíveis.

E doutro lado
as costas rastejam
o meu corpo

costas cuja convulsão
final me deixa falecer.


* para o c
* para a
Marta

[ Quase todos os dias posso morrer. ] [ (ficar) (aguardar) ]

Quase todos os dias posso morrer.
Não tenho chagas na boca
e provavelmente uma anciã
lavar-me-ia os beiços com água e pimenta.

Digo da morte identidades
que ignoro na pele

devaneio a minha mortalha
ofuscada
pelas outras, esses leitos anunciados,
macilentos que percorro
a sugar dias e horas e anos

tenho posse de anos e horas e dias
sugada em mim.


Não padeço de desprezo
engulo e regurgito
miragens, eis:

De covis sortidos chegam
perfumes azedos da angústia.
Berros em largada de cólera - Quantas vezes
(quantas vezes?)
tiveram de fugir com filhos a braços?

Retorço
internamente enxovalhada
respondo:
Ficar a aguardar conciliação nas mãos alheias?

(provavelmente uma anciã
lavar-me-ia os beiços com água e pimenta)
.



Procurar abrigo - Uma mulher e as duas filhas refugiaram-se num abrigo em Belize City, capital do Belize, antes da passagem do furacão “Dean”. (...)
Foto: Daniel LeClair/Reuters - publico.pt (21/08/2007)

[ que esperar de nós? *]

digo

o aperto da ambiguidade

com serventia ao nosso coração
labora calmo, devastador
a arrepiar a intimidade

leio

«(...) quando falávamos os nossos olhos não coincidiam
com nenhuma palavra.


Teria gostado de te levar comigo outra vez
mas era difícil recuperar as razões
para o desejo. E no caso de nos ter acontecido uma mudança
onde é que havíamos de procurar
os seus indícios?
(...)»

Rui Pires Cabral

auguro

Muitos estamos desprevenidos. A estação está a desoras com a tradição e outros tantos, distraídos no traje, estão a banhos frios. Enjeitados.

Assim é este modo

(escrevo o exercício do adeus)

tudo
este engodo, a minha despedida

A estes dias vou embora,
não se inteirem, não é da doença
mas do decurso da cura.

Assim me engodo.
Tudo à frente de todos.
Esvazio-me com cuidado.

excerto do poema de Rui Pires Cabral e photo, ambos surripiados à lebre

* título do JPN, respirar o mesmo ar

empatadas na pele [ amiga ]


Sempre a pele.
Com a pele

tiras-me
sempre palavras

porque estamos empatadas

nisso de
a pele
ser prioritária.







palavras da minha amiga
feliz aniversário e um beijo :)








photo: Carla van de Puttelaar

ao longo do dia, peles desnudas e respectivos odoríferos

Agora, de tarde, não temos sono.
Cheiramos à manhã que já protelou e arrogamos que pouco disto é tal como as intenções.
Os pescoços deram lugar às peles.
Não classifico, portanto, este órgão que anda de rompante em nós - entre bálsamos, aromas, perfumes e fragrâncias - exalações impertinentes de restos do dia. Os odores das peles haveriam de ser instrumentos legislados.
Agora, de tarde, acordados no nariz não temos sono, temos pressa no regresso.

Os odores das peles haveriam de ser instrumentos legislados [ao longo do dia, peles desnudas e respectivos odoríferos ]


photo: Carla Van de Puttelaar

hábitos e artefactos do resguardo das ideias

Hoje, de manhã e à tarde, muitos trazemos sapatos de verniz. Pretos. A madrugada foi para levantar da tarimba. Hoje colocaram-se muitos fatos do domingo e ajustaram-se nós de gravata que nunca se desfazem, são desaprendidos.
A cautela convencionada do aspecto.
Como as palavras também eleitas a dedo, da consciência.
O cuidado dos pescoços na escolha das palavras: tarefa admirável. É a percepção sublime da guarda à intimidade.

Artefactos do resguardo das ideias privadas.

Apologia dos pescoços.

Há 3 tipos de pescoços neste petiz canto do mundo: I. pescoços cerzidos; II. pescoços esburacados; III. pescoços lisos por fora. A última espécie divide-se ainda em 2 subespécies: a) pescoços lisos por fora e cerzidos por dentro e b) pescoços lisos por fora e esburacados por dentro. Todas as espécies são ruidosas e luminosas.
Verdade: não há silêncio em quaisquer pescoços.

Hoje, à noite, descalçamo-nos neste petiz canto do mundo.


imagem respigada à Alice

mostrengos como nós

Ando muito próxima do chão
(como se fora parido por mim)

não trago más notícias
apenas anuncio no chão
mais um nascimento

de emoção hipotética

ponho uma coragem
de cada vez
a autorizar o perdão
por ter aterrado.

O caminho e o chão andam, assim, longos no cansaço e nem por isso posso morrer hoje. Tenho de escrever cartas abertas para o meu testamento popular. Acasos dos julgamentos de mim.


Ainda não encontrei a solução para o milhar de histórias que passou nisto.
Não posso morrer depressa.
Mudo o tom.
Não trago más notícias, apenas este anúncio sabido.
A cachola quase se afogou para lá chegar.
São as coisas das emoções vacilantes.
São coisas do medo dentro do medo.
Coisas vulgares, portanto. Difíceis.
Não sei escolher culpados se oiço.
Sem inocência.
Assumi o namoro e casei
com as alucinações
não lhes sou desleal.

Sou mostrengo como nós
à nossa imagem inteligente.

Sem intervenções bacocas.







photo

coerência, estigmas e Monsieur Lavoisier

Pensava e escrevia e revia registos. Está tudo tão emaranhado, tanto quanto a minha cabeça que dói como se fora ela a própria dor. Não deixo que me suguem o que não há mais para sugar e logo direi stop. Penso e escrevo e revejo escrituras. Penso e engulo tudo. Se não engolir tudo nunca saberei o que ando a fazer à noite durante os sonhos rituais. Não posso parar. Espero que logo chegue rápido. Então estender-me a correr dentro da minha cabeça estas obsessões pelas quais ainda não percebi o processo empático. É importante esclarecer: #1 não sei; #2 “A coerência total é a das pedras e talvez dos imbecis” (Vergílio Ferreira); #3 penso a transformação, dizia há um ano - Porque não é um sonho, nem a falácia de um pesadelo. É a tua nudez a soldo com um pedaço a menos de inocência. És estanque no arrepio
-aragem à pele
sem abalar veloz. Abalar.
(grande celeridade)
Guardar o belo
(grande urgência)
do demais banalizado.

esclarecimento solene

Teria de fazer os retratos das criaturas. Porém distraio-me. Faltam-me construções não-verbais. Não sei a ciência da exactidão e sou alheada nos olhos.

(teria de fazer os retratos)

Acederia falas com cada fácies que acaso me declararia consentimento. Iniciaria malabarismos para os contratos visuais. Pegaria numa craveira de metal, lápis e folha protocolar. Mediria imprecisões. Olharia cada cabeça e pescoço de revés, depois a três quartos, dianteira e perfil. Talvez ajuntasse coragem para espreitar a nuca.

Alinharia os corpos dos retratos e educaria sobre a ausência de normas.

Não é empreitada inteligível reflectir cabeças sem mandíbula e pescoços sem voz. Acredito, os esgares que vejo acontecidos, são porventura sorrisos verídicos.







photo: anatomy lesson, Tony Ward

palavra tristesse no tempo

Agora não posso escrever isto. Não tenho tempo. (o tempo é a vontade de me levantar) As cartas restantes estão encerradas. Lambi as folhas até cortar a face em pedaços iguais às dores. (encolhi o sono até aos olhos arregalados) Fiquei quieta no corpo. Não tenho tempo para electrificar a voz, não desespero. Espero.

Estou a olhar a impotência a rodos.
(é a história toda sempre assim a circular em fórmulas que não soluciono)

Quisera abraçar a lágrima que está lançada.
.
.
Indaga. Num ápice avistarás
o relato das feridas sãs.

Quão abandonada amei o corpo -
missão horrorosa. Recordo
os vidros e o cuidado, socorro
a ideia do odor - sangue
enxuto em cinza (e o bafo,
indício do retiro). Entendo
peles de amar este corpo.

Explica-me o resto a prender-te aqui em renúncia.


Sam Taylor Wood
... foto surripiada ao Luís

boas!

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a verdade é que as obras anunciadas neste blog são de tipo sta engrácia, estão em andamento-interrompidas

como não gostamos (eu e o gato) de ver o blog no aspecto interrupção não-anunciada, exibimos aqui provas do nosso ócio
até já, até sempre!

carta aberta ao meu pai

Experimento o silêncio feroz da menina que tem o pai mais forte do mundo ao agarrar os nossos dias. E é natural que assim seja. És o homem que me oferece búzios a lembrar o encantamento pela natureza. Cresci a saber que os homens também lacrimejam. Cresci e não tenho penas de ter crescido.

Não se perde a doçura ao largar a meninez, diz-me cada instante no teu olhar.

Apostaste todas as apostas que fiz, e nunca me disseste que perdeste. Chamaste-me mulher quando te declarei as minhas derrotas.

De ti, trago esta sina de falar como se quisera cantar as palavras todas.
Um patriarca entre mulheres, de ti, trazemos a nossa palavra da noite. E eu quero que o mundo saiba desta laçada que me impele a dizer do homem que se atarefou de vida a fazer a vida.
Sei que permaneces comigo ao colo. Digo-te que o meu regaço cresceu no dia em que me disseste “Agora sou órfão.”.
Incorro numa promessa: estarei aqui na vida a fazer a vida, na força em que me alumiaste. Por nós, pelo bem-querer.

A cada vez que vou embora, peço-te em mudez a bênção.
A tua bênção, meu pai.








photo: You'll Be a Fortress and I'll Be Safe Inside Your Massive Walls, 1978
Jan Saudek

carta aberta à minha mãe

Relâmpagos entram sem licença pela parede de vidro desta divisão. E eu não tenho medo. Confesso o respeito. Não devo tardar a ouvir os rugidos do céu. Penso que não terei medo, mãe. Sinto a humidade na pele. O gato está aqui ao meu lado e acalmo-o na linguagem que me ensinaste. E eu aprendi.

Aí está o poderoso som dos trovões. Vês? Não tenho medo. Sinto a humidade na pele, não será adiada a chuva. A divisão está bonita com a porta escancarada para a noite.

Suspendo a respiração. Cai a água. Tanta força! Cai com tanta força, mãe.

Calei os sons todos da casa. Agora aceito desta noite o que o céu traz. Todos os sons do azul negro luz e dos bramidos de água fresca.

Silencio as acções a sentir o peito. Começo a ver a infância no aconchego em que me abraçaste. Cresço, já não sou apenas eu. Estás ali nas elaborações da vida. Caio por instantes num coágulo ao visitar os dias em que esmoreceste. E eu tive medo, mãe. E tu acordaste sempre de novo. Em gratidão, continuo a crescer. Reconheço-te. Não tenho ânsias. És bonita. Quero enxertar uma roseira na água desta noite, golpear a mão para fazer o pacto com a sua seiva e baptizá-la Ilda. Quero dizer-te tudo o que no silêncio dos olhos fica.

Quero dizer-te,
mãe, sem respeito
à natureza, se eu pudera
quereria ser tua mãe.














photo

processo [ e fantasia ]

É capaz de ser
verdadeiro,
__________ as coisas
crescem
como as flores
vingam
(ou os belos fungos)
deixam que suceda o tempo
às paisagens, e nós sem saber

eu explico, por exemplo eu
coisa
deixo tudo agora, desvio os olhos
descubro a boca a esquecer os sons todos
calados deixo os essenciais logo



se não esquecesse os sons
todos
a maquilhagem seria tão só
isso a tristesse

assim
das flores, ou só duma
flor
(ou dos belos fungos)
é pois que
me oriento na representação
sem saber para quê tanto
as paisagens.

(É capaz de ser
verdadeiro que as coisas
crescem.)





photo

para ela







Os olhos comeram-me viva
foi bom que acontecesse
desesperava já da náusea
era eu e era a razão dormida
longe de tudo.

O garrote guardou a fúria

aconteceu e eu não sei
como arranjei lidação
concebida a pele agarrou-se
não rebentou

é este calor, é aqui dentro
queima e não dói, mas queima
penso-me parda,
não-lúdica
estou mastigada viva ardo.




auto-retrato [ batalhas ]







esta sou a correr ainda impávida esta sou e seguro o vigor seguro muito sou eu aberta no apaziguamento levo todos os alentos dedicados levo os talismãs o calor deixo o excesso da bagagem deixo voluntária os excessos cá dentro é a conciliação































limiar

(Estou) aqui
nas respeitosas repetições*.
A constrição recai
nos comprometimentos. Olham-se
de soslaio. Fico a penar
na condição do juízo. Caio
no torpor. Animo-me e __________________imponho as mãos à obra.
(são as vulgares formas das travessias)

Agora, um pouco acordada, tenho
o bloco e o lápis físicos,
inicia a nova passagem.

(tenho medo)
_______________________________________respeitosa repetição.

-> La frontera, Lhasa de Sela

* expressão surripiada ao Paulo


Assim dói-me a pele.
Sinto os estalos todos
a estriar nas idades que tive.

É no corpo, dói-me a pele
do corpo atrás.
Não consigo contemplar uma ferida.
O ar passa com o tempo e encrespa-me.

Temo.
Se uma criatura me tocar, brotará algo?


















ilustração de Cláudia Santos Silva aka blue :)

aviso à navegação


Este blog estará inactivo temporariamente para obras, entretanto vou estando por ali e por ali

Olá :)

ah! Deixo-vos esta photo que me tem povoado

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photo de Hyeyoung Kim, que encontrei via Alex
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respondendo à blue: ainda não ;)

the birthday party remains

Nada mudou. Continuamos a gozar os sabores da terra e acabamos sempre adormecidos com as pernas escancaradas e o certo frio na pele. Frio humedecido pela maresia.
Esta noite tresanda a canela. Deixei o pau de canela na água quente que fez o chá e agora não me apetece levantar da cama para afastar a chaleira.
Parece que a minha indolência é mais forte do que a intolerância a esta espécie de intoxicação por canela.
Amanhã não poderei acusar a casa de emanar cheiros estranhos.
Quero estar aqui. Hoje.


. . .

Não lhe pergunto se fica para amanhã. Nem arrumo os restos da nossa festa.
(continuo e apetece-me sussurrar: Feliz Aniversário. )


. . .

Deixo-me ficar queda para não despertar o resto da noite.
E amanheço.

photo de Kim Winderman
som ->


para ti,
um beijo

"Vacances" [ poème en portugais ]

Não cometerei o embaraço
de contar pelos dedos
o aperto que se me dá
nas maminhas. É verdade.

Por estes dias, saborearei
os gostos da carne.


É a embriaguez dos estéreis,
voluntários do serviço,
à solta na estação estival.

Porém, desengane-se
se pretende criticar.


Aprendiz irrepreensível
da máquina, inebriada,
sou eu, leia o epitáfio
da fotomontagem:
“Infiltrada na consequência
da acomodação da classe, aqui,
numa pausa a degustar.
Merendou, sorveu, defecou.
Gozou dos coitos.
Nunca alcançou as artes.
Devota do sono,
com fé
n'A eternidade.”

















a falta de um poema [ O menosprezo e o brinde à paz. ]

Veio às minhas narinas o cheiro do balcão de mármore limpo da aguardente.
Não gosto do cheiro do pano que o limpou. Enjoo.
Olho para o copo (ou será um cálice? Nunca sei a nomenclatura dos cacaréus de enxoval.). Olho para o copo, os gestos corriqueiros. Inalo o álcool.
Eriçam os pêlos do meu corpo, acabado de engolir mais um. Acendo o cigarro, outro trejeito fútil. Que se lixe, nada de novo.
O que me dana é o garbo destes sítios. Deve de ser genética esta atracção. Bem, daí…
Não sei.
Custa-me um bocado a despedida.
Anseio pela partida.
- Outro, se faz favor.
Olham-me de soslaio. (sou uma carta de fora deste baralho, é mais do que evidente que é excessiva modernice uma mulher a empinar bagaços, ainda por cima encostada ao balcão) Com jeitos de gingão, aceno um brinde.
Há uma prateleira zelosa atrás do balcão exclusivamente dedicada aos ícones religiosos dos donos da taberna. Bonecos de loiça, pequenos folhetos com rezas, orações, súplicas, e preces inscritas e um colar de contas com uma cruz pendurada e o correspondente Salvador espetado. Hoje apetecia-me extravasar.


Não extravaso.


Self-Portrait with Yellow Christ, Paul Gauguin


som->

para ti, bonito

untitled


Sentei-me sobre o meu corpo.
Pretendo atenuar as dores queda.
Não tencionava magoar-te,
o meu corpo, entende, está doente.

Poderia atribuir estes requintes
de malvadez à minha inteligência,
bem sei. Tenho o corpo coberto
de dores e não morro. Sou nada.
Nem a coragem de me escapar agarro.
Nicles.

Poderia fazer muitas coisas, sabe-se.
Não actuo. Nicles. Pudesse andar
nua na rua, despercebida, desacautelada,
seria bem-aventurada.
Sei-o.

Hoje decreto que o meu infortúnio é ter de andar coberta.

Amanhã engendrarei outra verdade.


photos de António Fonseca

livros

Tenho-me encontrado comigo a espaços. Os últimos meses voaram, e eu com eles. Regresso por instantes, mas logo me agito por outras águas. Não cometerei a heresia de dizer que não tenho tido tempo para mim, mas a minha cabeça… não a tenho conseguido agarrar. Vá, não começarei com uma via-sacra de lamentações sobre tempo para ter tempo. O Carlos e o Hugo, chamaram-me à cabine de leitura e eu não me esqueci, aqui estou para juntar dois posts num, sobre leituras…

#1 Lidos - Costumo ter vários livros na mesinha de cabeceira, ultimamente não, tenho uma lista-de-espera de fotocópias espalhadas pela casa e pelo carro. Ando às voltas com o Al Berto, e tenho dado umas rapidinhas com o James Joyce - Retrato do Artista Quando Jovem. Não posso penar sobre o passado recente de parcas-leituras-pelo-puro-prazer, o que (me) interessa é que se avizinham as férias (está quase! está quase!), para o que já tenho The Dying Animal do Roth e 1984 de Orwell, conto também levar comigo a Maria Velho da Costa, o Vila-Matas, o Herberto Hélder e mais Al Berto.

#2 blogs-que-gostarias-de-ver-em-livro, porque tem que ver com as leituras, vou pegar nesta corrente e desabafar para aqui as minhas fantasias bloguísticas. Um blog é um blog é um blog, mas, sim, há alguns que gostaria de ver em livro (ou pelo menos partes) e são eles:
Sob(re) a Pálpebra da Página, pela beleza não só da escrita de que gosto muito, mas todo o arranjo com as imagens e porque aprendo sempre alguma coisa neste blog, só faria sentido (t)lê-lo em livro.
Gostaria de ter um livro das ilustrações da Cláudia e uma edição impressa das fotografias da Sandra.
Um dia sei que terei um livro da poesia da Maria e um livro da poesia do , e um de contos do Paulo. Bem, do António, já podemos ter livros, mas este diário propriamente dito também não ficava nada mal em livro.
Ter sempre estas personagens todas à mão também era muito bem pensado.
Outro blog que eu queria muito ter em livro era o ser mutante porque o safado do Carlos anda sempre numa de apaga e refaz (quer dizer, já nem lhe toca há não-sei-quantos-meses... ), assim eu tinha o livro guardadinho em casa e ele não podia apagá-lo
Pronto, porque acho que o conteúdo de qualquer destes blogs estaria à altura do papel e também pela possibilidade de um dia deixar de ter acesso a estes mesmos blogs (e a muitos outros), gostaria de os ter em livro... com direito a autógrafo, claro!

[ este trilho ]

Usas os olhos a desviar os teus sentimentos doutras dores. Eu sei. Sou e penso que sei. As tuas mágoas estão requintadas, quase não se parecem. Enfeitámos tudo de maneira a que o olhar, desviado e agora apático, usufrua de bem-estar. Fingir não foi má ideia. Assim chegámos ao olvidar completo. Podemos, mas não carecemos de dizer adeus.

Imaginem aqui uma foto azul com brisa. O colo. 'Muitos' braços e sono. Sol na pele. Bom fim-de-semana, gente. J

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o dia com os meus blogs: ele voltou! :)
Naoki Mitsuse

I'm sandra aka margarete ~ acknowledgeyourself@gmail.com












































Uma árvore é uma obra de arte quando recriada em si mesma como conceito para ser metáfora.


Alberto Carneiro