la caisse du mouton
Antoine de Saint-Exupéry

carta aberta à minha mãe

Relâmpagos entram sem licença pela parede de vidro desta divisão. E eu não tenho medo. Confesso o respeito. Não devo tardar a ouvir os rugidos do céu. Penso que não terei medo, mãe. Sinto a humidade na pele. O gato está aqui ao meu lado e acalmo-o na linguagem que me ensinaste. E eu aprendi.

Aí está o poderoso som dos trovões. Vês? Não tenho medo. Sinto a humidade na pele, não será adiada a chuva. A divisão está bonita com a porta escancarada para a noite.

Suspendo a respiração. Cai a água. Tanta força! Cai com tanta força, mãe.

Calei os sons todos da casa. Agora aceito desta noite o que o céu traz. Todos os sons do azul negro luz e dos bramidos de água fresca.

Silencio as acções a sentir o peito. Começo a ver a infância no aconchego em que me abraçaste. Cresço, já não sou apenas eu. Estás ali nas elaborações da vida. Caio por instantes num coágulo ao visitar os dias em que esmoreceste. E eu tive medo, mãe. E tu acordaste sempre de novo. Em gratidão, continuo a crescer. Reconheço-te. Não tenho ânsias. És bonita. Quero enxertar uma roseira na água desta noite, golpear a mão para fazer o pacto com a sua seiva e baptizá-la Ilda. Quero dizer-te tudo o que no silêncio dos olhos fica.

Quero dizer-te,
mãe, sem respeito
à natureza, se eu pudera
quereria ser tua mãe.














photo

I'm sandra aka margarete ~ acknowledgeyourself@gmail.com












































Uma árvore é uma obra de arte quando recriada em si mesma como conceito para ser metáfora.


Alberto Carneiro