somos sim. tanto. estranheza. essa canção traz-me a sensação dessincronia com os relógios. todos. (não mencionarei um metrónomo) como quando qualquer caminho que se tome e que parece ser errado para roma. os estranhos tornam-se mais estranhos. estamos nós estranhos a nós. a playlist que se seleciona fica bloqueada no ouvido externo. é aquele local sem aparente processamento possível. surge algo que parece um saber que nos ensina que jamais voltaremos ao mundo. acabou. confirma-se a sensação de que nunca fôramos dali. adormecemos num canto qualquer da casa. geralmente, agachados. o sono é realizado e voltamos a ser estranhos para outrem. não olhamos para trás porque pode ser perigoso. não lemos pavese porque não. não lemos dagerman porque não lemos. voltamos às velhas e seguras playlists. num repente, qualquer coisa pequena faz-nos imóveis. voltamos a lembrar que a qualquer momento se pode girar os discos e até virá-los. aquele lullaby está ali para emergências. só nós sabemos e suspeitamos que todos nós saibamos. revolta-se o velho sonho dos homens: voar. talvez este seja um pobre relato. nunca sei o que fazer com a comoção para além da comoção. é um inner-out telling about. se tento encontrar uma nomenclatura perco-me e corro o risco de ser preconceituosa. assim sendo, relato a estranheza da comoção:
oiço um ávido - tia! tia! vem cá!
- onde?
- à casa de banho.
chego lá e encontro o seu pequeno corpo a tentar equilibrar-se para não cair naquele buraco, as mãozitas sustentam o seu peso e a sua voz diz-me que já não é preciso fraldas e a sua voz diz-me que aquele ser já é grande porque faz controlo voluntário daqueles esfíncteres. consciente, o meu corpo pára e concentra-se involuntariamente ali. continua a crescer. desce da sanita, desenrola papel higiénico em quantidade absurda num movimento notavelmente desembaraçado. há um momento de pausa ao que sou informada de que é a minha vez de participar.
- ainda não sei limpar o pipi, tia.
participo. limpo enquanto relato a sequência e remato - é assim, vês?
aqueles olhos são grandes. e brilham. são tão novos. acaba a minha quota parte e o pequeno ser que povoa a minha vida do lado que está vivo, continua, porque há mais que foi aprendido.
- agora puxo as cuecas para cima e concerta-se a saia para baixo. é assim, vês?
comovo-me. pego-a ao colo. abraço-a. o sorriso dela é tão novo! e os olhos.
- já sei fazer xixi e cocó na sanita! estás feliz, tia?
estou. tanto. somos tão estranhamente. quero mais.
oiço um ávido - tia! tia! vem cá!
- onde?
- à casa de banho.
chego lá e encontro o seu pequeno corpo a tentar equilibrar-se para não cair naquele buraco, as mãozitas sustentam o seu peso e a sua voz diz-me que já não é preciso fraldas e a sua voz diz-me que aquele ser já é grande porque faz controlo voluntário daqueles esfíncteres. consciente, o meu corpo pára e concentra-se involuntariamente ali. continua a crescer. desce da sanita, desenrola papel higiénico em quantidade absurda num movimento notavelmente desembaraçado. há um momento de pausa ao que sou informada de que é a minha vez de participar.
- ainda não sei limpar o pipi, tia.
participo. limpo enquanto relato a sequência e remato - é assim, vês?
aqueles olhos são grandes. e brilham. são tão novos. acaba a minha quota parte e o pequeno ser que povoa a minha vida do lado que está vivo, continua, porque há mais que foi aprendido.
- agora puxo as cuecas para cima e concerta-se a saia para baixo. é assim, vês?
comovo-me. pego-a ao colo. abraço-a. o sorriso dela é tão novo! e os olhos.
- já sei fazer xixi e cocó na sanita! estás feliz, tia?
estou. tanto. somos tão estranhamente. quero mais.
talvez este seja um pobre relato. nunca sei o que fazer com a comoção para além da comoção. é um inner-out telling about.
photo de Carlos Veríssimo, 2006