la caisse du mouton
Antoine de Saint-Exupéry

ouvidos/nariz/garganta//face [ mímica simpática e parassimpática, não-apática ]


Avaliei o que sobrou de voz. Percebi peva.
O único dado exacto é o da sequidão. Engoli água nas várias consistências possíveis. E temperaturas.
Estimo que se tenha afugentado qualquer vibração da minha fala.
Procurei ajuda, tratamentos. Para o(s) tratamento(s), cuidei saber primeiro de que se trata a maleita. (Que é assim a ordem das coisas, pensei.) Não é que goste de andar a entreter-me aos diagnósticos, mas finalmente lá consultei um clínico que ficou a olhar-me boquiaberto, com uma expressão de estranheza, não posso dizer “estarrecido” ou “maravilhado”, no entanto, a reacção dele… diria que me pareceu que o clínico ficou “atónito no bom sentido”. Enfim, um embaraço, pois nem por isso me resolveu a questão, mandou-me tomar aspirina e espirrar sob o efeito de Melaleuca alternifolia 3x/dia. Tea-tree. Sem marcação de próximas consultas.
A inalação de vapores com tea-tree deu azo a uma reacção, de facto. Espirrei. Melaleuca alternifolia. O nome não me sai da cabeça e a fala trambolha se o tento pronunciar. Melaleuca alternifolia. Queima-me a boca. Queima. Agora também o uso nos dedos dos pés, mais precisamente nas unhas. Está a parecer-me que irão atingir alguma boniteza. Mas continuo sem perceber o que fazer da voz. Abro a boca e logo oiço sopros. Ninguém teve ainda coragem de me dizer, porém estou certa de que ando incompreensível. Enfim.
A enciclopédia médica que tenho aqui diz-me pouco sobre sussurros e sopros na voz. (Por falar nisso, tenho de actualizar a subscrição da Reader’s Digest.) Começa a cansar-me este não-mutismo-soprado-mas-fluente que a início parecia ter a sua graça. Treino a articulação verbal-oral de Melaleuca alternifolia, várias vezes ao dia. E algo cheira-me a irreversibilidade. Custa-me. Presumo que sentirei solidão.

photo de Rachel Combs-Gullick, dali

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Uma árvore é uma obra de arte quando recriada em si mesma como conceito para ser metáfora.


Alberto Carneiro