la caisse du mouton
Antoine de Saint-Exupéry

[ distracção ]

Não me sai da boca o sabor agoniado de secreções velhas. É um nojo, bem sei. Não me sai da boca esse danado. Uns disseram-me que falasse para que muito ar passasse nas cavidades a espairecê-las. Outros aconselharam-me silêncio. Já afastei as pessoas para que não tenha de ver os esgares face ao meu bafo. Tenho a casa de banho repleta dos mais revolucionários elixires. Deixei e retomei o fumo, tentei cachimbo, cigarrilha e charuto. Vomitei. Regurgitei. Nada venceu o escarro. Para as cavidades mais estreitas, trago uma bolsa de cotonetes comigo. E um saco de toalhetes. Outro saco para os sujos. São cada vez mais os metros que me distam de outros seres. O telemóvel interrompe tempos-a-tempos a rede, suspeito que sejam efeitos do vapor acre-doce. De nada vale esticar mãos, não tento. Nem ler poemas com as solicitações “ouve-me” ou “toca-me”. Não. Uma espécie de morte nesta vida. Tem sido assim. Tudo em volta do fedor da boca. Hoje, o espanto. Recebi uma carta, uma ordem de despejo. Motivo: a inquilina deixa o átrio e escadas do prédio alagados de sangue à sua passagem. Corri, quer dizer, iniciei uma corrida que interrompi de imediato para verificar que, de facto, ando a deixar um rasto. Percebi, então, a função distractora do fedor da minha boca.



photo de Elena Getzieh, (dali) proposta da lebre :)

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Uma árvore é uma obra de arte quando recriada em si mesma como conceito para ser metáfora.


Alberto Carneiro