preferia sair de casa em camisa de noite, fingindo sonambulismo, a admitir que era assolada pela insónia. uma senhora e a sua reputação são sempre absolvidas pelos actos involuntários comandados por um estado de cuja consciência não pode ser responsabilizada. na rua, cerca das 5 da madrugada, caminhando por entre a humidade do nevoeiro, era necessário um álibi, nenhum melhor que a desculpa do que não se sabe que se faz. despia o seu papel de dama na sala, puta na cama, despia a camisa de noite e procurava uma enfermidade que se pudesse sentir no corpo, os pulmões eram a sua primeira escolha - sempre se convencera de que uma pneumonia tinha algo de sofrimento legítimo, sofrer asfixia seria um bom castigo por se existir. arrogância sua, sonhar a escolha daquilo de que padeceria, olhou a branca camisa de noite de algodão indiano, sangrava por todo o tecido que lhe chegava aos pés - morreria pelo útero, uma morte que chegava dos ovários.